Passava eu sempre em frente àquela casa
Sem notá-la do meu tristonho bonde;
Escondida entre a folhagem vasta
E uma velha e ressequida fonte.
Mas eis que um dia, enquanto eu dormitava
Sentado ao bonde, a chacoalhar nos trilhos,
Reparo numa jovem que me olhava
Debruçada à janela, nos caixilhos.
Lançava-me, assim, u’olhar estranho
– Algo entre amoroso e inibido –
Mas deixou-se a impressão estar ficando
Às costas do meu bonde esbaforido.
Assim, levei meu dia normalmente
Sem nem pensar na jovem da janela;
Porem , quando era tarde e eu retornava
No mesmo e igual lugar estava ela.
Então eu pude vê-la com clareza,
Olhando-me contente c’um sorriso
Enquanto caminhava o velho bonde
E eu lhe acenava indeciso.
Desse dia em diante, à mesma hora,
Quando passava o bonde, às três e cinco,
A jovem da janela me esperava
Enquanto eu lhe acenava com afinco.
Passou-se o tempo, como se esperava,
Navegando nos eflúvios do namoro
E eu, apaixonado, enrubescia
Cedendo aos meus instintos de decoro
Havia vezes, quando eu passava
Ardente de saudades da donzela,
Mas eis que a minha dama me esperava
De amores, suspirante, na janela.
Chegou um dia em que eu, não resistindo,
Saltei do bonde ainda em movimento
Rasgando as roupas nos cercados baixos
E atravessando o matagal cinzento.
Porém, ao ver, de perto, aquela casa
Querendo que a donzela me sorrisse
Sofregamente pus-me a procurá-la
Até que a doce imagem me surgisse:
Estava na janela e me esperava
Com o mesmo anelo e amor ardente
E eu “espera um pouco” lhe gritava
Enquanto tinha o coração tremente.
Abrindo, então, a porta docemente,
Olhei sobre a janela, repousada,
Para meu grande e imenso desespero
Apenas a cabeça decepada…